segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Meu funeral, lista.

Esta é a lista de desejos para que meu funeral não seja assim, aquela coisa triste e cruel para com os vivos. É sério. Quem for ajudar na festinha, por favor imprima este e entregue ao mestre de cerimônias. E não reclame, que este é um assunto muito sério. Eu quero um enterro hype.
- Começa pelo defunto em si. Por favor, eu passei a vida andando de jeans e camiseta, com tênis ou haviana e algum acessório estapafúrdio, não me venham com vestidinho preto e casaquinho brega, hein? O moço da funerária deve ser informado para vestir qualquer coisa bem confortável – e deixar um estratégico canivete no bolso da frente, para o caso do legista ter se enganado e eu estar apenas apopléctica, não morta. - O caixão. Muito bem, eu sei que tem a explicação sobre o cheiro. As flores ao redor do presunto espantariam o odor de... bom, de presunto (e não no bom sentido). Mas eu agradeço e recuso. Odeio crisântemos e iria para a cova contrariada caso me colocassem em uma caixa com aquelas flores hediondas. Podem borrifar Carolina Herrera 202 no tecido interno, causa o mesmo efeito e fica mais agradável. Vale um travesseirinho debaixo do meu coco também. Meu pescoço causa dores, é um inferno. - Sobre o som, eu prefiro que role algo que eu realmente gostava, como Beatles. O bom é que é só ajeitar uma disqueteira e colocar ali uns 12 álbuns dos meus rapazes de Liverpool, nem vai dar trabalho. Como assim não tem música em velório? Lógico que tem! No meu vai ter. Se quiser, aparece lá. - Inclusive, seria bom avisar bastante gente, porque não quero ficar com fama de sem-amigos numa hora dessas, tá? Imagina o que os demais defuntos iriam dizer? “Hum, essa aí deve ter sido uma bela jararaca em vida, olha o córum mirradinho que ela teve!”. Eu venho puxar o pé de quem não comparecer, juro. - Para dizer bem a verdade, eu não curto velórios. Acho muito desagradável fazer as pessoas, principalmente as mais amadas, passarem uma noite toda em claro ouvindo papo chato de tia sem noção que diz coisas como “ela tá descansando agora, viu? E você já sabe pra quem vai dar aquele relógio carrilhão dela? Hein?”. Se alguém insistir em fazer pra mim, eu quero que dure uma hora apenas. Ah, vai, isso já é suficiente para saber se o sujeito empacotou mesmo (pois ter essa certeza era, antigamente, o motivo de fazer velório). Se depois uma hora ouvindo gente passar e dizer “olha que rosto bonito, foi em paz” o indivíduo não acordar e gritar “porra, vira o disco!”, é porque morreu mesmo. - Dá para servir um chá de ervas? E uns biscoitinhos de aveia e umas carolinas? Acho que o pessoal vai gostar. E podem até ganhar mais simpatia por minh’alma.
- Olha, podem dispensar também as coroas de flores, viu? Aquilo parece primeiro prêmio de turfe, aquelas coisas que colocam no lombo do cavalo quando ganha o derby. A não ser que todas venham com a inscrição “Cruuuuuza o disco final!”. Aí eu gosto! Até porque, faz sentido. - Digam à minha mãe para não chorar tanto e ao meu pai para parar de tomar providências, por favor. Eu sei que é isso que eles fariam. Se bem que, espero muito, eles não estejam lá para presenciar a coisa toda. Espero, isso sim, seguir para junto deles. Sempre gostei de ir dormir com os dois, não mudariam nem morta. Ops, desculpa o trocadinho numa hora dessas. - Quem vir gente apanhando minha filha (minha pequena Sofia) pelo braço e falando coisas estúpidas tem a licença para lançar o desgraçado para fora da sala com um golpe estilo Chuck Norris. Está jurado: se eu pegar neguinho dizendo a ela “vai sentir saudade da sua mãe, né?” ou “agora você está sozinha no mundo... mas passa lá em casa pra um café”, volto da tumba pra não deixar pedra sobre pedra. - O féretro em si: bom, eu pensei em ser carregada por uns oito rapazes generosos e boas-praças, e não ser levada naquela impessoal mesinha de transporte. Olha, se não forem encontrados nem oito pessoas para me prestar essa última homenagem, podem jogar em qualquer canto, porque significa que ninguém se importa mesmo! - Eu sei, a lista está ficando imensa, mas agüenta só mais um tiquinho; eu queria falar sobre a sepultura. Se possível, gostaria de algo simples, mas com estátua e lápide. E aquelas fotinhos que ficam em uma moldura bonita com ano de nascimento e morte embaixo (tem um clique ótimo de mim, está no desktop, já no tamanho e com boa resolução). Nada de estátua duvidosa, hein? Lembram a dúvida que gerou o túmulo do amasso. Pode ser uma ninfa, uma deusa. Pode ser uma réplica de “Apolo e Dafne” em mármore de Carrara esculpida por italianos e enviada diretamente de Roma? Se pudesse, eu ia ter um descanso tãããão legal... - Sobre a inscrição em si, não sei bem o que deveria ter. Podia parodiar Billy Wilder e escrever “Sou escritora, mas ninguém é perfeito” ou Karl Marx, que usou “Trabalhadores do mundo, uni-vos!”. Ou fazer uma versão própria e gravar “Aqui jaz Thayana. Ei, tem algo atrás de você!”. Ou então "Ela preferiu morrer dormindo como seu avô do que em profunda dor, como os passageiros do ônibus que ele dirigia". - Ei, nada de gracinhas, certo? Se me enterrarem debaixo do solão, sem uma árvore para dar guarida, eu vou aprontar todas naquele cemitério! Já avisei, bom. - Pensando bem agora... ficar lá na terra, sozinha, à mercê dos vermes... Debaixo da terra, dentro de uma caixa lacrada, debaixo da terra... Eu acho que quero ser cremada. Isso aí, cremada! Depois eu mando uma nova lista com as providências! Aguardem em paz.

Nenhum comentário:

Postar um comentário